sexta-feira, 13 de junho de 2008

Acaba a crise dos camionistas em Portugal, começa a crise do “não” na Europa

1) A crise dos camionistas portugueses acabou com um acordo com o governo. Muitos criticam o acordo: cidadãos contribuintes acham que foi uma cedência que todos nós vamos pagar; grupos de camionistas contestam abertamente os que os representaram, quer da ANTRAM quer dos representantes ad-hoc dos piquetes, pela cedências. Por outro lado, as oposições em peso e muitos comentadores contestam a falta de previsão e a lentidão do governo em responder à crise e em repor a liberdade de circulação ameaçada assim como o perigo de que o precedente aberto, por ter cedido com medo de uma paralisação do País, venha a incentivar outras reivindicações de outros grupos profissionais. No fundo até acho que todos têm razão. Porém sou levado a pensar que o governo não tinha muitas alternativas. Eu, que nem votei Sócrates e que tenho discordado radicalmente da acção deste governo em 99% dos casos, até sou de opinião que dum modo geral teve nesta questão um comportamento correcto, evitando confrontos violentos e negociando rápida e eficazmente. O certo é que a crise acabou em poucos dias e, se houve prejuízos, estes foram na maior parte dos casos limitados e suportáveis.

2) Já na crise que hoje começa a nível europeu, motivado pelo "não" irlandês, discordo radicalmente do nosso governo, dos outros governos europeus, da Comissão Europeia e do respectivo Presidente, da grande maioria dos comentadores e da atitude pouco independente dos próprios jornalistas.
Achei um acto de contorcionismo intolerável a transformação do projecto de Constituição, ou mais correctamente do Tratado Constitucional, num tratado chamado reformador e que, para mal de nós, ficou conhecido com Tratado de Lisboa, que mudando o nome e a forma de apresentação mantinha 95% do conteúdo do outro, segundo a opinião insuspeita de Giscard d’Estaing. Mas principalmente, pelo que me foi dado saber do conteúdo do Tratado, infelizmente não pelo próprio texto que tentei estudar, mas cuja linguagem quase impenetrável e constante remissão para os tratados anteriores não facilitava a tarefa, mas sim pelos tópicos de que pude ter conhecimento pela imprensa, muitas das suas proposições pareceram-me altamente inconvenientes e duma tendência centralista perigosa. Finalmente, para não me alongar demasiado, o golpe de rins que representou a decisão de o ratificar nos parlamentos, evitando os referendos populares, com a única excepção da Irlanda por imperativo constitucional, pareceu-me nojentamente antidemocrático. Não porque rejeite a democracia representativa, mas porque este processo foi confessadamente escolhido para "evitar o perigo" de recusas populares. No caso português acresce que o referendo era uma promessa eleitoral que foi contrariada com argumentos ridículos.
Por tudo isto regozijei-me com o "não" irlandês, apenas anunciado não oficialmente, mas que espero confirmado ainda hoje. A crise não vem da vitória do "não"; vem do evidente, agora ainda mais, divórcio entre as opiniões públicas e as atitudes oficiais dos seus representantes.

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