terça-feira, 17 de abril de 2007

Democracias

Salazar era confessadamente antidemocrático. Detestava a democracia parlamentar multipartidária e certamente não concordaria com a célebre frase de Churchill quando este disse "Democracy is the worst form of government except for all those others that have been tried " , apesar de pretender apreciar a liberdade política na Inglaterra ao afirmar, depois de terminada a II Guerra Mundial, que as eleições que preparava em Portugal seriam "tão livres como na livre Inglaterra ” . Viu-se! Isto não impediu que um número considerável de cidadãos o tivessem elegido o melhor português de sempre numa votação recente que se pode considerar até certo ponto democrática, apesar de não representativa. É certo que se tratava apenas de um passatempo, mas o facto de os votantes terem escolhido para o 2.º lugar Álvaro Cunhal, que também não morria de amores pela democracia parlamentar multipartidária, leva a pensar, com todas as reservas devido à falta de representatividade reconhecida pela entidade promotora, a RTP, que um número considerável de portugueses não aprecia verdadeiramente a democracia, embora se possam dizer democratas. Enfim, talvez sejam democratas não praticantes. Se o primeiro inventou o conceito bizarro de “democracia orgânica”, o segundo, no extremo oposto do espectro político, era partidário das “democracias populares”. Ambos os conceitos têm o grau de democracia conhecido. Se o voto maciço em Salazar pode ter como causa parcial uma reacção às notícias de que a RTP teria alterado as regras do jogo, instituindo uma segunda fase de votação nos 10 primeiros, para tentar alterar a escolha já então maioritária de Salazar, a votação, ainda importante, em Cunhal não pode ter a mesma explicação e a verdade é que se muitos espíritos consideraram assustador a colocação de Salazar como o primeiro, não dei por admiração nem susto pelo segundo lugar conquistado por Cunhal.

Mas que dizer de quem combate as ideias que considera erradas vandalizando um cartaz que lhes parece condenável por defender, segundo afirmam, ideias reprováveis? Será que se consideram democratas? Claro que isto se refere ao cartaz afixado pelo PNR no Marquês de Pombal. Este meu comentário não significa uma concordância com o que o cartaz diz e menos ainda com o que muitos consideram que o cartaz defende, embora não o diga explicitamente. Mas ideias erradas combatem-se com ideias. O vandalismo de um cartaz, porque não se concorda com o seu conteúdo, é sempre reprovável. Ao menos o cartaz dos humoristas do Gato Fedorento representou uma resposta ao mesmo nível.

Os grandes movimentos de extrema-direita que marcaram as primeiras décadas do século passado, o nacional-socialismo alemão e o fascismo italiano, bem como muitos movimentos congéneres noutros países, caracterizavam-se pelo seu carácter violento e intimidatório. Os resultados foram, como é bem conhecido, trágicos. Actualmente, muitos movimentos conotados com a extrema-direita apresentam-se como democráticos e pacíficos. Se as desconfianças de que este posicionamento é apenas estratégico são justificáveis, não é com acções violentas, entre as quais incluo o vandalismo, que se pode combater o ideário que defendem. É pena não ter ouvido a mínima reprovação de nenhum partido, individualidade ou comentador que se considere democrático destes actos de vandalismo. Também não é com intimidação, e as alegadas ameaças de que os elementos do Gato Fedorento terão sido alvo são igualmente condenáveis.

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