quarta-feira, 7 de fevereiro de 2007

Aborto (4) ou talvez não

Notícias recentes vieram lembrar-me a existência de um costume bárbaro e ilegal na Europa que as pessoas civilizadas, entre as quais julgo incluir-me, gostariam de ver erradicado. Não, não me refiro ao aborto, mas sim à excisão feminina. Muitas vezes efectuado sem quaisquer condições de higiene, sem anestesia, clandestinamente, afecta gravemente as suas vítimas, normalmente jovens mulheres cuja vontade não é consultada nem tida em conta.

Pois bem, a melhor solução para esta barbárie será despenalizá-la, se efectuada a pedido da própria ou da família durante os primeiros 10 anos de vida em estabelecimento para tal oficialmente aprovado. Acaba-se assim o flagelo, a humilhação, os perigos para a saúde das crianças sujeitas a esta prática. Claro que somos todos contra a excisão. Mas já que ela existe e a sua realização na clandestinidade é causa de tantos perigos e inconvenientes, nada como legalizá-la. E assim a ablação cirúrgica do clítoris, dos pequenos lábios e, se livremente solicitado, até dos grandes lábios será feita de modo higiénico e sem perigo nem sequelas, a não ser as inevitáveis de perda das partes retiradas, como é óbvio.

Certamente que os defensores do "sim" no próximo referendo à liberalização do aborto provocado (também chamada, só para complicar "despenalização da interrupção voluntária da gravidez") concordarão com a minha proposta, já que as situações, embora não totalmente equivalentes, têm muito em comum. Só não sei se para a despenalização da excisão será ou não de pedir um referendo. Deixo este pormenor à apreciação dos políticos ou dos juristas.

Dir-me-ão que há grandes diferenças entre os dois casos. Claro que há. Em primeiro lugar no caso do aborto perde-se uma vida enquanto que na excisão apenas se perdem alguns órgãos não fundamentais.
Reconheço que, por outro lado, no caso do aborto não é possível pedir a opinião do embrião, que, segundo me dizem, nem tem o sistema nervoso central formado, e portanto não terá opinião formada. No caso da excisão, nem sempre a própria concordará. Mas não obrigamos as nossas crianças a tantas coisas que elas não querem, como lavar as mãos antes de comer ou ir para a escola, porque achamos que as opiniões delas a respeito de muitos assuntos ainda não são de levar em conta. Daí prever um limite de idade. De resto em muitos casos, por educação, pressão familiar ou medo de não poder casar, a excisão é feita por vontade ou com o consentimento da própria. E não estou a ser sensacionalista: Há dias ouvi noticiar que o corpo clínico dum hospital italiano chegou a discutir a hipótese de efectuar uma excisão a pedido.

Concordo que a minha ironia sobre este caso pode ser considerada cruel. A minha desculpa é que estou a falar duma prática também cruel: o aborto.

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