domingo, 1 de outubro de 2006

Ainda a lição do Papa em Ratisbona

Para mim, o discurso do Papa levantava outras questões muito interessantes, para além da posição sobre o Islão e mesmo da polémica da expansão da fé, de qualquer fé, por meio da espada.

A principal destas questões, e parece-me que base de todo a dissertação, é a relação entre razão e fé. Apesar de parecer intenção do Papa afirmar que a fé não deve ser contrária à razão nem ignorar a razão, é evidente que tem como dado adquirido implícito que a razão sem fé é estéril e redutora do homem na sua dimensão integral.

A este respeito é sintomático que o Papa classifique como "cepticismo radical" a opinião de um colega de que havia alguma coisa de estranho na Universidade de Ratisbona: o facto de ter duas faculdades devotadas a algo que não existia: Deus. É indiscutível para o Papa que "face a este cepticismo radical seja ainda necessário e razoável suscitar a questão de Deus através do uso da razão". É esta a base da dissertação do Papa. Quanto a mim é louvável que se tente aproximar a fé da razão, tornando-a assim obviamente mais razoável. Mas parece-me bem que haverá limites a esta aproximação. Afinal é pela razão que muitos agnósticos se interrogam sobre os dogmas da fé e que muitos ateus não crêem neles.

Na mesma linha de pensamento, o Papa afirma que "pela sua própria natureza, este método [o método científico baseado na experimentação («sinergia entre a matemática e o empirismo»)] exclui a questão de Deus, fazendo-a parecer um problema não científico ou pré-científico. Consequentemente, estamos em face de uma redução do âmbito da ciência e da razão, que necessita ser questionada." Se o colega atrás citado tem razão, não há nisto qualquer redução, pois o que fica de fora afinal não existe.

Não pretendo com isto afirmar que creio que a ciência e a razão abrangem integralmente todos os aspectos do pensamento humano (Já Pascal afirmava que não!). Mas prefiro colocar-me ao lado dos que, crentes ou não crentes, pensam que a ciência e a fé tratam de questões diferentes e que, tal como não será possível provar a existência de Deus por métodos científicos, também não poderá provar-se a sua inexistência. O que não prejudica o intento louvável de aproximar a fé da racionalidade, pelo menos para evitar que possa levar a extremos de irracionalidade.

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